A cidade de São Paulo recebe uma série de passeios mal-assombrados, pouco antes do Halloween, pelo centro da capital, sendo que o luxuoso e icônico Edifício Martinelli costuma ser uma das paradas dos roteiros.
Afinal, entre as décadas de 1950 e 1970, o local passou por depredação, teve casos de assassinatos, exploração sexual e tráfico de drogas — com relatos de fantasmas perambulando pelos andares mais altos e elevadores que funcionavam sem ativação durante a madrugada.
Antes de entender as histórias de assombrações no Edifício Martinelli, é importante contextualizar os relatos de atividades paranormais que cercam a região do Vale do Anhangabaú, onde o prédio se localiza em São Paulo.
Uma das hipóteses para esses fenômenos remonta à colonização do Brasil, quando os tupis-guaranis habitavam a região.
Os especialistas ouvidos pela reportagem apontam que os jesuítas José de Anchieta e Manuel da Nóbrega evangelizaram os indígenas e associaram — erroneamente — uma entidade chamada Anhangá, que se relacionava às florestas, a algo maléfico. Atribuíram essa ideia à divindade à crença de que ela agitaria e perturbaria as almas.
Porém, Thiago de Souza, pesquisador e idealizador do projeto O Que Te Assombra?, que aborda as histórias misteriosas acerca do centro de São Paulo, afirma que essa associação “foi deturpada”. Isso porque Anhangá não era um ser maléfico: sua função era equilibrar, proteger e mediar as florestas.
No entanto, essa não é a única hipótese sobre como surgiram as histórias mal-assombradas do Edifício Martinelli. A própria construção do prédio carregou um clima tenso: ocorreu em meio à disputa entre seu fundador, Giuseppe Martinelli, e os arquitetos do Edifício A Noite, no Rio de Janeiro, que possui 24 andares.
Na época, os dois tentavam criar o arranha-céu mais alto da América Latina — atualmente, esse título pertence ao México, com a Torre Obispado.
Com um projeto inicial que previa 12 andares, a competição fez com que Giuseppe Martinelli acrescentasse pavimentos ao Edifício Martinelli. Inaugurado em 1929 com 130 metros de altura, o empresário italiano pediu para os engenheiros construírem mais 18 pisos.
“Quando chegou ao 25º andar, Giuseppe Martinelli ainda construiu mais cinco pavimentos para ser sua casa particular: tem uma mansão do empresário no topo do edifício”, contou ao CNN Viagem & Gastronomia.
Com uma arquitetura eclética, misturando barroco francês, italiano, o neoclássico e o gótico, Edison Cabral, antigo porteiro e atual pesquisador do Edifício Martinelli, também contou que usaram sangue de boi na construção do prédio.
“O cimento vinha da Suécia e da Noruega na cor rosa. Chegando aqui, eles colocavam sangue de boi [no material] para dar uma tonalidade mais forte”, disse ao CNN Viagem & Gastronomia. “O prédio é muito bem feito, sendo construído com bastante amor. Acredito que passará de mil anos”.
Após gastar muito dinheiro na construção, Giuseppe Martinelli vendeu o prédio para o governo italiano em 1933. O edifício voltou a ser propriedade brasileira só quando o país aderiu ao grupo dos Aliados, composto pelos Estados Unidos, a União Soviética, o Reino Unido, na Segunda Guerra Mundial, em 1943.
“É quando o Edifício Martinelli começa a ficar largado, a ser invadido e a ter uma série de atividades criminosas lá dentro, como jogos, exploração sexual, tráfico de drogas”, relembrou Thiago de Souza.
Edison Cabral acrescentou que as degradações começaram na década de 1950. Na época, cerca de 3.000 pessoas moravam no imóvel irregularmente.
“O prédio passou por momentos difíceis mesmo: foi do luxo ao lixo entre o final da década de 1950 até 9 de maio de 1975, quando a Prefeitura de São Paulo o interditou”, contou.
O edifício era usado de “maneira predatória”, segundo Thiago de Souza. Quando limparam o local, encontraram cerca de 30 metros de lixo, que vinha do poço do elevador até o sétimo andar, além de carro, motos, animais e até ossadas humanas. O prédio se tornou cenário de crimes e os relatos paranormais começaram.
Quais são as histórias sobrenaturais do Edifício Martinelli?
Um dos casos mais conhecidos de assassinato foi do jovem judeu Davilson Gelisek, que sumiu após entregar uma encomenda no Martinelli. “O menino foi violentado em uma orgia, provavelmente, e depois foi degolado, morto e jogado no poço do prédio”, contou Thiago.
Essa não é a única história de assombração: há boatos de um fantasma perambulando a partir do 20º andar do Edifício Martinelli. Esse espectro seria de uma garota chamada Rosa, vista pela última vez entrando no prédio com um homem muito mais velho.
“Não dá para fazer juízo do que ela foi fazer lá, mas dizem que ela se prostituía — isso não é certeza. Fato é que um segurança do terreno de um banco a viu sendo jogada do segundo andar, e acharam os sapatos dela no 17º andar”, contou Thiago.
Thiago ainda relembra outras duas histórias sobre o Edifício Martinelli, sendo uma delas sobre os elevadores, que são antigos e só funcionam a partir de ativação interna com um ascensorista. “Você entra no elevador, fecha ambas as portas e ele sobe — e numa ocasião, os elevadores começaram a andar sozinhos de madrugada”, relembrou Thiago.
A outra lenda é sobre um zelador que pegou os elevadores até o 14º para apagar as luzes. “Quando ele subiu para desligá-las, alguém falou: ‘Olha, eu estou trabalhando. Deixa a luz acesa’. Ele foi ver quem estava trabalhando, e não tinha ninguém. Era um fantasma fazendo cerão”, finalizou Thiago, com um riso irônico sutil.
Como explicar os fenômenos sobrenaturais?
Quem acredita em fenômenos sobrenaturais e fantasmas entende que os espectros e as almas ficam presas aos seus locais de martírio físico, segundo Thiago de Souza. “Isso seria ou para chamar atenção à sua existência, para tentar apontar quem são seus matadores e algozes, para tentar desfazer injustiças, ou por algum apego mundano, seja financeiro ou carnal”, completou.
Já do ponto de vista de quem não acredita em fantasmas, a ideia é outra: para esse grupo, o fenômeno sobrenatural é um instrumento para processar os traumas, como os assassinatos, ocorridos em um determinado lugar.
“É um jeito de demonstrar que aquela memória e ferida continua aberta a partir dessa fixação de um espectro que é, na verdade, o reflexo do trauma maior. Muitas vezes, ou quase sempre, ligada a esse tipo de trauma: assassinato, escravidão, violência contra mulher, contra criança”, disse Thiago.
Atualmente, o Edifício Martinelli espantou a fama de um local perigoso: conta com mais de 3.000 funcionários e um fluxo diário de 5.000 pessoas por dia. “São várias secretarias: de subprefeitura, de desenvolvimento urbano e licenciamento, de habitação. Na parte de fora, temos o Sindicato dos Bancários, a Caixa Econômica Federal e 11 lojas ao redor”, finalizou Cabral.
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